Preso após ejacular em uma mulher em um ônibus de São Paulo na última terça-feira (29), Diego Ferreira de Novaes, de 27 anos, conta com pelo menos 16 passagens por delitos sexuais registradas na polícia nos últimos oito anos. O modo repetitivo como o jovem comete as contravenções levantou questionamentos acerca de sua saúde mental — especialmente após sua mãe afirmar, em entrevistas, que o filho passou a apresentar transtornos de personalidade desde 2006. Na ocasião, Novais teria sofrido um acidente de carro e adquirido ferimentos graves na cabeça, passando por duas cirurgias no cérebro.
Segundo decisão publicada pelo TJ-SP (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo) no último domingo (3), ele — que acaba de ser condenado a dois anos de prisão — deve agora passar por exames que avaliem sua condição mental. “Há indícios acerca de possível desvio de personalidade que leva o indiciado à prática reiterada de delitos sexuais”, diz o documento. O juiz Rodrigo Marzola Colombini, responsável pela audiência de custódia, ainda reitera que o próprio Novais “reconhece que tem algum tipo de problema e que por isso necessitaria de acompanhamento psiquiátrico — ele mencionou já ter ‘ouvido vozes'”.
O R7 conversou com especialistas para entender as possíveis causas que levam um indivíduo a perder o controle sobre os próprios impulsos sexuais. Os médicos reforçam que, antes de qualquer julgamento precipitado, é necessário que Novais seja examinado dos pontos de vista mental e físico, com avaliações neurológicas e laboratoriais.
De acordo com a psiquiatra e sexóloga Carmita Abdo, presidente da ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria), uma das possibilidades é que o ajudante de serviços gerais sofra de uma condição chamada frotteurismo.
— Esse distúrbio significa que a pessoa apresenta uma necessidade de se aproximar de desconhecidos em lugares públicos, geralmente aglomerações, e friccionar seus órgãos genitais. Há contato físico com as vítimas e a pessoa obtém prazer desta forma.
O frotteurismo, de acordo com a especialista, pode ser até uma consequência do acidente de carro sofrido supostamente pelo ajudante de serviços gerais: “Os relatos dizem que ele ficou em coma por 15 dias e passou por cirurgias no cérebro. Isso pode indicar que ele tenha uma sequela neurológica, o abalo de alguma estrutura cerebral que tenha resultado nesse comportamento sexual alterado. Caso essa hipótese se comprove, o Novais provavelmente tem outros distúrbios, não só no plano sexual”, comenta.
Transtornos de personalidade envolvendo indiscrições sexuais são causados principalmente por lesões nos lobos frontais do cérebro, segundo Renato Anghinah, neurologista e professor livre-docente da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo),
— Em um acidente automobilístico, por exemplo, pode haver o chamado TCE (traumatismo cranioencefálico), que ocorre quando uma força externa causa um ferimento traumático no cérebro. Esse tipo de lesão, além dos transtornos sexuais, pode causar — de forma permanente — efeitos cognitivos como diminuição da atenção, perda de memória, comprometimento de sentidos, como o olfato, e outras compulsões. São relatadas também alterações comportamentais, como apatia ou agressividade.
Dados do CDC (Centers for Disease Control and Prevention), dos Estados Unidos, apontam que 1,7 milhão de pessoas por ano sofre um TCE. “No Brasil, não há dados específicos do Ministério da Saúde para o TCE, mas com base nas estatísticas americanas é possível estimar que 1,1 milhão de pessoas passam por esse tipo de trauma no País anualmente”, pondera Anghinah.
Deficiência mental
Em relação ao caso de Novais, Carmita levanta ainda uma última hipótese: a de que o ajudante de serviços gerais tenha alguma deficiência mental.
— Um indivíduo que se expõe por 16 vezes, sem tomar nenhum cuidado a respeito de seus atos ou ocultar seu comportamento, ele me parece pouco hábil diante de situações sociais. Talvez ele tenha uma deficiência consequente ou não de um acidente ou de um trauma no crânio. Pode ser que, realmente, uma deficiência mental faça com que ele não tenha alguma capacidade de julgamento ou de adequação à realidade.
Direito ao tratamento
Se o diagnóstico de Novais for positivo para algum distúrbio ou deficiência mental que leve a inadequações sexuais, a sexóloga afirma que o tratamento mais indicado é aquele que envolve tanto acompanhamento psicoterápico como o uso de medicamentos.
— Deve-se haver uma terapia no sentido de redirecionar a sexualidade dele para uma forma mais adequada de convívio em sociedade. Em conjunto, podem ser usados remédios antidepressivos, que atuam na diminuição da libido. O importante é que seja feita uma reeducação sexual para que ele não mais cometa esses atos — que, em última instância, acabam expondo e violentando pessoas, além de fazê-las passar por sofrimentos desnecessários.
Anghinah, por sua vez, reforça que o ajudante precisa ser examinado por uma junta médica formada por neurologistas e psiquiatras: “O mais importante é lembrar que esse indivíduo precisa ser avaliado com olhos isentos. Independentemente do ato que ele cometeu, se for comprovado realmente que ele é um doente psiquiátrico ou neurológico, existe o direito a um tratamento”, conclui o neurologista.
R7