A necessidade de isolamento social definiu a residência como o lugar mais seguro para quem quer passar incólume pela pandemia. Ter, em casa, um quintal; ou, no apartamento, uma varanda passou a ser desejo, necessidade ou vontade de muitas famílias, o que, inclusive, acabou por impactar sensivelmente no mercado de imóveis, tanto para compra como para aluguel.
O covid-19 deu nova conotação à palavra “morar”. “Quero uma casa com quintal, onde, nesses tempos de covid-10, eu possa ter uma horta e que haja espaço suficiente para a minha família praticar seus hobbies. Onde tenhamos espaço para ampliar nossa liberdade de criação”, disse à Agência Brasil a intérprete de libras Magda Petter Oliva, 46, mãe de duas estudantes com 12 e 20 anos.
Por causa da pandemia, as três têm ficado direto em casa. “Agora, até o cachorro parece ocupar um espaço enorme. Descobrimos que moramos em um apartamento muito pequeno”, disse ela referindo-se ao imóvel de pouco mais de 70 metros quadrados.
Magda está, desde março, tentando trocar o apartamento de dois quartos na Vila Mariana, em São Paulo, por uma casa com jardim, no mesmo bairro. Ela diz que “o estalo” para ir atrás desse desejo ocorreu logo após as primeiras notícias de que o covid-19 se espalhava rapidamente pelo país.
As filhas da intérprete têm como hobbie pintura e yôga. E Magda pratica tecido acrobático, esporte de origem circense, que envolve acrobacia aérea executada em um longo tecido suspenso. “De fato, é impossível fazermos tudo isso dentro do apartamento”.
Após três meses de busca, Magda chegou à conclusão de que o covid-19 acabou aumentando a procura por casas, a ponto de refletir no valor cobrado pelo aluguel. “Os preços estão subindo, me forçando a rever a faixa de preço que pretendo pagar, que passou de R$ 5 mil para R$ 6 mil mensais”.
Quintais, varandas e imóveis rurais
A percepção de Magda é corroborada pela gerente de Marketing Brasil do Imovelweb Angélica Quintela. Levantamento feito pela empresa, que atua nas 27 unidades federativas, aponta que, em maio, foi registrado um crescimento de 19% na busca por imóveis com quintais, quando comparado a abril.
“Na comparação com maio de 2019, a alta na procura por esse tipo de imóvel ficou em 96%”, detalhou a gerente de Marketing.
Além disso, houve um aumento de 20% na procura por imóveis com varandas, na comparação a abril. “Comparando maio de 2019 a maio de 2020 o crescimento ficou em 128%. Esse movimento já havia sido observado em abril, e continuou crescendo em maio”, completou.
O levantamento aponta também que, a partir de março, houve aumento na busca por imóveis rurais. Entre fevereiro e março o aumento ficou em 52%. Entre março e abril, 40%; e, entre abril e maio, mais 23%. Na comparação com 2019, o crescimento chegou a 310%.
Medo do Coronavírus
Foi pelo medo que tem do covid-19 que a dona de casa Amélia Vieira, 58, fechou a casa que tem em Valparaíso de Goiás (GO), região do Entorno do Distrito Federal, para morar em uma chácara em Luziânia (GO).
“Sou hipertensa e tenho uma filha cardíaca, de 24 anos. Levei, nas primeiras semanas, meu pai, de 93 anos, que além de ter Alzheimer usa marca-passo, para ficar com a gente. Somos todos do grupo de risco e isso me preocupa muito”, disse Amélia à Agência Brasil.
Como a opção pela mudança foi repentina, não deu para preparar a chácara para o pai, que acabou tendo de voltar pois requer muitos cuidados. “Lá havia risco até de ele se perder, por causa do Alzheimer”, disse Amélia que, devido às necessidades do pai, acaba retornando, uma semana a cada mês, a Valparaíso. “Por precaução, minha filha permanece na chácara”, disse.
Dificuldades e visitas online
Mudar de um apartamento para uma casa era algo que já estava nos planos do consultor de projetos da indústria de alimentos Bauducco Carlos Dilinski, de 50 anos. A chegada da pandemia ao Brasil acabou fazendo com que ele buscasse uma casa mais espaçosa do que a pretendida inicialmente.
“O covid-19 acabou atrasando todo o plano traçado por mim e minha família, porque inviabilizou as visitas aos imóveis que pretendemos alugar”, disse ele ao relatar a dificuldade para conseguir mudar do município paulista de Guarulhos, onde mora com a esposa e três filhos, para Bragança Paulista (SP), cidade mais próxima de seu trabalho.
Na pressa por evitar os longos deslocamentos que faz até o trabalho e de dar uma qualidade de vida ainda melhor para a família – que devido ao isolamento social tem ficado bem mais em casa –, Dilinski aderiu até a videoligações para conhecer, de longe, os imóveis disponíveis.
Segundo a gerente da Imovelweb, há atualmente diversas ferramentas tecnológicas que permitem as visitas online, sem necessariamente a pessoa se dirigir ao imóvel.
“Um outro dado interessante, que também obtivemos por meio de uma pesquisa com nossos usuários é de que 27% das pessoas fechariam negócio apenas com fotos e vídeos do local, sem realizar uma visita presencial”, disse Angélica à Agência Brasil.
Escolha difícil
A tecnologia, no entanto, ainda deixa inseguros alguns clientes na hora de assinar o contrato. “Estou tentando, mas é muito difícil fechar um negócio dessa forma. Apesar de ter feito visitas desse tipo, prefiro esperar a situação melhorar para ir conhecer de perto os imóveis”, pondera Dilinski.
A intérprete de libras Magda Petter tem opinião parecida. “Já fiz algumas visitas online, mas acho muito mais difícil, tanto a escolha como a tomada da decisão pelo imóvel”, disse.
Magda relata que esse tipo recurso é uma forma de compensar a falta de pessoas disponíveis para mostrar o imóvel, preocupadas com o risco de contaminação pelo covid-19. “Em parte, porque muitos dos corretores estão na idade considerada de risco para o novo coronavírus. E, também, pelo temor de alguns proprietários em abrir o imóvel [para possíveis locatários]”, disse.
Agência Brasil