Vizinhos de porta, Claudio e Sheila nunca tinham percebido um ao outro. Já faziam dois meses desde o início do isolamento. Divorciado, ele dizia preferir agora a companhia dos livros, discos e dos seriados na Tv a ter que novamente conviver com uma pessoa que certamente não o entenderia. Ela, solteira convicta, era ótima dançarina. Pretendentes não faltavam, mas preferia os relacionamentos fugazes a ter que aturar alguém ao seu lado, dividir armário do banheiro, lavar pratos sujos deixados em cima da pia e se assustar com a tampa do vaso sanitário respingada; situações que aconteceram de forma constante em seus relacionamentos anteriores, os quais preferia esquecer.
Um dia se viram frente a frente ao atender a campainha e receber as compras de mercado feitas por delivery. Ele tinha diabetes. Ela era asmática. Cinquentões, foram colocados em trabalho remoto. Cláudio, engenheiro de uma das maiores construtoras de Salvador; e Sheila, assessora parlamentar. Trocaram os primeiros olhares (e viam apenas os olhos um do outro – os dele, castanhos, os dela, negros) e também um trocaram um bom dia. Foram simpáticos e trocaram também algumas palavras sobre a pandemia, esperanças de o isolamento acabar.
– Quer um café? – ele perguntou.
– Se for forte, sim – respondeu ela.
O isolamento fez deles extremamente carentes. Depois da primeira xícara já estavam jogados no sofá, se amando sem medo – afinal, isolados, que mal haveria?
E foi assim nos sete dias seguintes… até aparecerem os primeiros sintomas. Essa história não acaba aqui, já que ambos continuam internados. Ele no Couto Maia. Ela no Espanhol. Mesmo correndo perigo, ainda tinham saudade do primeiro cafezinho.
+++
chicossauro_rex
digaslavador@gmail.com