A cumplicidade e a amizade são dois dos principais ingredientes dos relacionamentos amorosos. As principais manifestações desses ingredientes acontecem através da conversa e, principalmente, através da forma como o parceiro amoroso é ouvido: com atenção, envolvimento, simpatia, empatia, apoio e respeito. Ouvir o parceiro dessa forma é uma dos grandes benefícios oferecidos pelos relacionamentos íntimos.
Quando o relacionamento é equilibrado há uma alternância entre os parceiros que ouvem dessa forma: aquele que tem coisas mais importantes acontecendo fica com a prioridade de ser ouvido dessa forma, enquanto o outro funciona como ouvinte ativo e receptivo. Quando ambos têm coisas importantes acontecendo, a alternância nos papéis acontece na mesma conversa.
Quando as pessoas se gostam e estão comprometidas entre si, elas sempre têm espaço e boa vontade para ouvir, apoiar e ajudar o parceiro dessa forma. Elas também têm espaço para ouvir o que está acontecendo de bom com o parceiro e para comemorar com ele.
Neste artigo usarei a expressão “troca de favores” para me referir a este papel de ouvir prolongadamente o parceiro nos seus momentos de necessidade e de comemoração. Vamos examinar agora, mais detalhadamente, esse tipo de troca de favores.
A conversa como troca de favores
Em muitos momentos das conversas acontece uma espécie de troca de favores. Essa troca se dá de acordo com uma espécie de trato: “Eu ouço você falar daquilo aquilo que você está motivando para falar, mesmo que eu não tenha tanto interesse no que você vai dizer – participo da forma que for útil para você (mostrar-me-ei interessado, solidário, empático, ajudante para entender o que está acontecendo, contribuirei com minhas percepções sobre o que você está relatando e sobre como você está se portando, etc.) – e, depois, é a minha vez, eu falo o meu assunto e você faz a participação adequada. Vamos fazer isso embora eu esteja mais interessado em falar das minhas coisas do que em te ouvir você falar das suas ou de conversar sobre outros temas”.
Neste tipo de troca de favores, para quem fala a motivação pode ser intrínseca e, para quem ouve, a motivação é trazer benefícios para o parceiro, manter o relacionamento com ele e ficar com crédito para também falar suas coisas.
Somos educados não apenas para ouvir e falar de assuntos que estamos diretamente interessados, mas também para falar de assuntos que sejam importantes para o interlocutor. Além disso, quando só ouvimos e falamos daquilo o que estamos interessados, desestimulamos o interlocutor e é possível que ele tome medidas para lidar com isso, como mostrar desinteresse, mudar o assunto e terminar a conversa.
O jogo da cortesia
Em uma conversa geralmente cada participante adequado teme se lançar em seus assuntos sem sondar se há interesse do outro interlocutor por ele. Esse temor acontece por motivos:
Motivação incompatível. Possibilidade de ignorar assuntos importantes que estejam na cabeça do interlocutor. Caso isto aconteça, ele participará da conversa como cortesia: simulará motivação para participar, mas, no fundo, estará achando chato.
(2) Falta de motivação intrínseca ou extrínseca positiva e participara apenas por motivação negativa. Embora o interlocutor não tenha nada fortemente ativado para tratar, mas achar aborrecido ouvir o que você quer dizer.
A reciprocidade da troca de favores tranquiliza
Geralmente nos sentimos mais confortáveis para contar com a paciência, tolerância e cooperação do interlocutor quando este também costuma lançar mão deste tipo de serviço quando precisa. Trata-se, então, de uma troca de favores.
Troca de favores na mesma conversa ou em diferentes ocasiões
Geralmente em uma mesma conversa há muitas trocas de favores. No entanto, essa troca não necessita acontecer na mesma conversa. Pode acontecer em conversas diferentes: “Nós nos ajudamos e nos apoiamos. Quando estou mal ele me ajuda. Quando é ele que precisa, eu estou disponível.”.
Fatores que pressionam para prestar de favores
A troca de favores pode ser mantida por diferentes motivos. Os principais deles são os seguintes:
Para ficar em paz consigo mesmo. Mostrar indiferença quando o outro está passando por um mau momento pode gerar culpa.
Para evitar sanções de terceiros ou de instituições (a sociedade pune quem não presta favores, tal como acontece no crime de “omissão de socorros”).
Porque a pessoa afetada não tem espaço psicológico para abordar outros assuntos. Não adianta falar de outra coisa quando o interlocutor está muito afetado por algum assunto.
Não acatar um assunto muito importante para o interlocutor pode ser encarado como uma falta de consideração muito grande. Mesmo quando o interlocutor mais afetado não deseja abordar o assunto que o está afetando, todos ficam sensíveis e disponíveis para as suas necessidades.
Acontecimentos que dão direito a favores
Certos acontecimentos são tão importantes que se tornam assuntos quase obrigatórios de conversa, assim que são comunicados. O interlocutor quer ou se sente obrigado a abordá-los ou a recepciona-los assim que são abordados. Os outros assuntos se tornam menos importantes. Por exemplo, quando um dos interlocutores acabou de ser assaltado; morreu recentemente um parente seu.
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