Em noite de exaltação da força e papel social da mulher negra, o concurso elegeu a nova Rainha do mais antigo bloco afro da Bahia
Carregando no topo da sua cabeça o punho cerrado da resistência e, em seu rosto, um sorriso largo, Jéssica Almeida Nascimento dos Santos, 19 anos, já mostrava, desde os primeiros movimentos no palco, que era forte candidata a vencedora da 39º edição da Noite da Beleza Negra, na noite de ontem (20), na Senzala do Barro Preto.
Ao todo, 16 mulheres negras concorreram ao disputado e emblemático título de Deusa do Ébano. Com casa lotada e uma plateia entusiasmada, o maior concurso de beleza e exaltação da mulher negra do Brasil teve nesta edição o luxuoso patrocínio da Avon e show de encerramento do fenômeno do pop-funk carioca Dream Team do Passinho. O evento contou também com apoio do Governo do Estado da Bahia por meio da Secretaria de Comunicação e Secretaria de Turismo.
A direção artística do espetáculo teve assinatura do respeitado Elísio Lopes Jr. O júri apresentou um time de peso, como a psicóloga e ativista Mafoane Odara, coordenadora do Instituto Avon. “Precisamos de mulheres reais, como a Jéssica, com sonhos e vidas reais. Com aspirações que façam outras meninas a quererem ser o que elas são. A Deusa do Ébano é a história que muitas meninas precisam para mudar suas histórias”, revela Mafoane. Na escolha difícil das vencedoras, também estavam a atriz
Giovanna Ewbank que, ao lado do ator Bruno Gagliasso, vem lutando contra o preconceito acerca da sua filha Titi; a jornalista e estudiosa Silvana Oliveira; as coreografas Nildinha Fonseca e Edeise Gomes; o professor doutor Carlos Benedito; e o Diretor e Vice-Presidente do Ilê Aiyê, Aliomar Almeida.
Entre os fãs do Ilê que prestigiaram o evento estavam a apresentadora Regina Casé, acompanhada do marido e filha, e Caetano Veloso, que anualmente marcam presença no Curuzu, além do comediante Luiz Miranda, da cantora Liniker, dos atores Bruno Mazzeo, Fabiola Nascimento, Fabrício Boliveira, João Miguel, Thalita Carauta, Zé Manuel, Emanuelle Araújo, do blogueiro John Drops, Tia Má, além da dupla Sulivã Bispo e Thiago Almasy e de diversos políticos baianos.
A Deusa e as Princesas
Aos 11 anos, Jéssica esteve pela primeira vez na Noite da Beleza Negra e desde de então já avisava aos seus pais: “Eu quero ser uma Deusa”. Foi o que aconteceu. Aos 19 anos, em sua primeira participação, a moradora do Cabula cativou todos os jurados e, por unanimidade, foi declarada a Deusa do Ébano de 2018. “Desde que passei na seletiva, que foi uma coisa inacreditável para mim, eu já me sentia Deusa. Quando eu cheguei no palco, que eu vi o público e senti aquela energia, foi mágico. Só no Ilê a gente consegue ser o que a gente quer”, revela. Quando questionada sobre o que ela espera deste ano, Jéssica não esconde a alegria. “É uma felicidade muito grande, mas ao mesmo tempo é uma responsabilidade imensa. Agora sou um símbolo de representatividade. Vou levar o nome do Ilê Aiyê comigo, para o meu bairro, para as crianças, para todas as mulheres negras”, completa.
Ganhadoras dos segundo e terceiro lugares, eleitas Princesas do Ilê Aiyê, Milena Sampaio Nascimento, 33 anos, e Lorena Matos dos Santos, 20 anos, respectivamente, destacaram a importância na transformação social e no empoderamento da mulher que o concurso promove. “Estamos aqui para representar todas as negras, a nossa ancestralidade e o amor ao Ilê”, revelou Lorena, já ansiosa para desfile do Carnaval. Já para a arte educadora Milena, que participa pela quinta vez do concurso, esse título significa “entender que eu tenho o potencial de fazer a transformação política e social através do bloco”.
Super produção do palco da Senzala
Mais uma vez, cada uma das pessoas que lotou a Senzala do Barro Preto foi arrebatada pela emoção em diversos momentos da Noite da Beleza. Música, teatro e dança se alternaram para reverenciar o grande homenageado da noite, Nelson Mandela, que inspira o tema do Carnaval do Ilê Aiyê este ano, “Mandela. A Azânia celebra o centenário de seu Madiba”.
Diferentes performances fizeram referência aos pontos críticos na realidade social brasileira, questões graves que o país enfrenta e que, certamente, estariam sob a mira do olhar de um homem como Mandela nos dias de hoje. Paz, respeito à diversidade sexual e combate à corrupção foram algumas das abordagens que o espetáculo trouxe ao palco, com participações especialíssimas, como a do cantor e compositor Mateus Aleluia, dos atores David Jr. e Hilton Cobrinha e da transformista Divina Valéria. As coreografias do Ilê apresentadas durante o espetáculo, foram assinadas pela Rainha do Bloco em 2009, Edilene Alves.
Fechando com chave de ouro, o Dream Team do Passinho tirou o fôlego da plateia. Toda a arte, estilo, ousadia e irreverência da favela invadiu o palco da Senzala do Barro Preto com o grupo de pop funk carioca fenômeno no Brasil formado por Lellêzinha, Diogo Breguete, Hiltinho, Pablinho e Rafael Mike. O Dream Team abriu o show com ao lado da Banda do Ilê Aiyê, promovendo um encontro entre a favela da Bahia e do Rio de Janeiro ao cantar a canção Refavela de Gilberto Gil. Depois, foi um sucesso atrás do outro, encerrando com “Oi, Sumido”, música de trabalho deles.
Foto: Odu Comunicação/divulgação