Fazer xixi sem querer enquanto tosse ou ir ao banheiro a cada 10 minutos são situações incômodas e constrangedoras, mas se engana quem pensa que isso só acontece com idosos. Segundo a fisioterapeuta e sexóloga especializada em assoalho pélvico Mirca Ocanhas, 20% das mulheres têm incontinência urinária e esse número dobra na fase pós-menopausa, entre os 36 e 50 anos. E a bexiga hiperativa (caracterizada pela vontade urgente de urinar) é mais prevalente na população que a diabetes, que atinge 9 milhões de brasileiros. Disfunções urinárias são apenas parte dos problemas que poderiam ser evitados e tratados com fortalecimento do assoalho pélvico. Mas o que é exatamente isso?
Mirca explica que o assoalho pélvico é um conjunto de músculos que formam uma rede de sustentação, localizada entre o cóccix e a bacia, e o enfraquecimento desses músculos pode causar diversos problemas que afetam a qualidade de vida, como incontinência urinária, fecal e prejudicar a vida sexual. Entre 60% a 70% destes problemas poderiam ser evitados com o fortalecimento desta região.
— O assoalho pélvico faz a sustentação dos órgãos da cavidade pélvica (bexiga, órgãos sexuais, reto etc). É como se fosse o chão que segura todos os nossos órgãos. E, como qualquer músculo, ele deve ser fortalecido. A gente controla o bíceps, o quadríceps etc, e esquece que pode controlar esse músculo que quase nunca ouvimos falar. Se não cuidar, pode cair tudo.
A fisioterapia do assoalho pélvico trabalha a musculatura de acordo com as necessidades do paciente. Mirca ressalta que é importante que a pessoa procure um profissional especializado e não faça qualquer exercício sem orientação, nem utilizar assessórios sem conhecimento.
Disfunções urinárias
Dentro da porcentagem de mulheres com incontinência urinária, a metade sofre com problema moderado ou grave. As atletas também são bastante afetadas pelo problema, segundo Mirca.
— Oito em cada dez pessoas com mais de 70 anos têm incontinência urinária e as mulheres são 2 vezes mais atingidas do que os homens.
— Quando fazemos exercícios físicos, colocamos top em cima e, às vezes, até dois para segurar os seios. Mas, e embaixo? Não colocamos nada. Por dentro balança tudo e precisa de estrutura muscular para segurar útero, bexiga, reto. Durante o período menstrual ficamos mais molinhas também por causa dos hormônios. Se corremos, sacode tudo.
A bexiga hiperativa é outra disfunção bastante comum entre a população e pode afetar qualquer pessoa, independente do sexo ou da idade. Os tratamentos indicados são a prescrição de medicamentos e fisioterapia.
— No entanto, a maioria dos pacientes abandona o tratamento medicamentoso porque diminui a produção de saliva e lágrimas e aumenta a chance de constipação [intestino preso], segundo a especialista.
O oposto também ocorre e pode ser um problema. Essa disfunção é a hipocontratilidade. Mirca explica que pessoas que demoram 6, 8 horas para fazer xixi acabam perdendo a capacidade de contração da bexiga, que é uma estrutura elástica.
— O ideal é não passar mais de 3 horas sem fazer xixi.
Problemas intestinais
Outro problema bastante comum e pouco falado é a retocele [ou prolapso da parede vaginal]. Segundo a especialista, cerca de 50% das mulheres têm retocele, mas não levam o problema ao consultório médico. Em casos mais graves, é necessário introduzir o dedo na vagina para que a mulher consiga evacuar.
— Se a mulher não evacua com frequência, aquele cocô vai para algum lugar e acaba empurrando a parede da vagina. Se o assoalho pélvico estiver fraco, o reto se projeta para dentro do canal vaginal. Então, a mulher precisa colocar o dedo na vagina para conseguir evacuar e vai levando a vida. Não precisa chegar a isso.
Mirca afirma que 60% dos brasileiros têm constipação. O bom funcionamento intestinal depende, principalmente, da alimentação. Porém, às vezes a musculatura não permite a boa evacuação.
— Não se pode prender cocô por tanto tempo. Tem que evacuar, se possível, todos os dias. A falta de evacuação também pode ocasionar outro problema intestinal: o megacólon. Esse transtorno intestinal é caracterizado por dilatação anormal do intestino grosso.
Problemas sexuais
Os exercícios também ajudam a mulher a melhorar a vida sexual. Mirca afirma que, no Brasil, 50% das mulheres não conseguem atingir o orgasmo e 33% com idades entre 35 e 59 anos têm disfunção sexual. A porcentagem quase dobra na fase pós-menopausa: entre 50% e 71% sofrem com o problema devido à queda nos níveis de estrogênio.
— O fortalecimento pode ser usado no benefício da relação sexual. O orgasmo por definição é a contração da musculatura do assoalho pélvico, por meio de estimulação desencadeada pelo ato reflexo. Os exercícios podem estimular a parte sensorial que, muitas vezes, passa despercebida. Essa musculatura se prende no clitóris. Se eu contrair, ela vai expor as terminações nervosas sensoriais e as sensações agradáveis vão começar a surgir.
A terapia do assoalho pélvico também pode ser benéfica para mulheres que sentem dor nas relações sexuais e para aquelas que sofrem de vaginismo, que é a contração involuntária dos músculos da vagina que impedem que a mulher seja penetrada, seja por pênis, dedo ou até cotonete. A dificuldade de se chegar ao orgasmo é outro problema frequente e que também pode ser resolvido com os exercícios, esclarece Mirca.
Gravidez
De acordo com a especialista, no caso das grávidas, o fortalecimento do assoalho pélvico é ainda mais indicado porque facilita na hora do parto e previne a incontinência urinária.
— Nos nove meses de gravidez eu transformo a minha a minha estrutura para que meu bebê passe suavemente. A gente passa esse período com 50% a mais de sangue circulando e os hormônios vão lá em cima. Nós ficamos fofinhas, macias e molinhas justamente para parir.
Além de ajudar no parto, os exercícios de fortalecimento ajudam as grávidas após o nascimento do bebê, evitando a incontinência urinária, por exemplo. A disfunção é uma das reclamações mais comuns de mães, que liberam xixi em situações inusitadas, e o problema pode atingir também mulheres que passar por cesarianas, como no caso da jornalista e apresentadora Mariana Ferrão.
Mariana relatou que após um parto traumático, ela adquiriu incontinência urinária. Para que a história não se repetisse, ela começou a fazer exercícios de fortalecimento pélvico com Mirca e conseguiu ter o tão sonhado parto normal na segunda gestação.
Ainda de acordo com a especialista, países como Dinamarca, Alemanha, Suíça, França e Espanha pagam o tratamento para mulheres reeducarem o assoalho pélvico após a gravidez.
R7